Nem só de piscinas instagramáveis, serviços de excelência ou decorações arrojadas vive o setor hoteleiro de luxo em Portugal. São cada vez mais as unidades que apostam também na arte e no artesanato como parte integrante das suas narrativas conceptuais, com intervenções artísticas feitas por encomenda, ciclos de exposições temporárias, peças de artesanato elaboradas à medida ou coleções privadas utilizadas como elementos-chave de decoração.
Eis uma panóplia de dez hotéis que não pretendem ser galerias, nem museus, mas que levam muito a sério o elogio às artes e ofícios.
L’And Vineyards, Montemor-o-Novo
Desde a sua criação que o L’AND Vineyards – Relais & Châteaux eleva a fasquia no Alentejo integrando arquitetura moderna, design de interiores e artesanato, no sentido de criar uma atmosfera de luxo sóbrio e de tranquilidade. As obras de arte, o mobiliário e as peças de artesanato fazem parte da identidade deste hotel vínico, destacando-o dos outros projetos hoteleiros no campo alentejano.
O projeto de arquitetura é da autoria do gabinete Promontório e o design de interiores ficou a cargo do arquiteto brasileiro Márcio Kogan, que recebe a sua inspiração do artesanato local, como são exemplo os tapetes feitos à mão na Fabricaal, em Reguengos de Monsaraz, e o chão de ardósia e a madeira de eucalipto.
Os elementos de design também fazem parte integral do resort, com luzes void de Tom Dixon, cadeiras e mobiliário exterior de João Serôdio e peças de madeira concebidas à medida por George Nakashima. A sala de leitura do hotel apresenta uma pintura etérea de Michael Biberstein, que fez também uma obra de arte para cada suite. A fotografia está muito presente não só nas suites, como nas áreas públicas, com trabalhos de fotógrafos contemporâneos de renome internacional, incluindo Blaufuks, Fernando Marante e Marcio Villela.
Herdade da Malhadinha Nova, Beja
Com mais de 25 anos de história e uma presença ativa na região, a Herdade da Malhadinha Nova tem na arte, no design e no artesanato uma das mais fortes características do projeto. A reconstrução das ruínas da propriedade contemplou o recurso a técnicas alentejanas, como os pavimentos em terracota, as paredes caiadas e as peças de cestaria trabalhadas em buinho, uma planta local. Porém, o interior de cada casa e dos 26 quartos da herdade, concilia peças de design nacional e internacional com objetos e mobiliário de artesãos alentejanos e portugueses.
De destacar que a Malhadinha Nova apoia o projeto TASA, uma iniciativa algarvia que combina design contemporâneo com materiais e artesãos ancestrais, e o projeto Manicómio, criado por Sandro Resende e José Azevedo, a partir de vários anos de trabalho no Hospital Júlio de Matos com artistas que vivem com doenças mentais. Estes são apenas alguns exemplos da prioridade dada pela Malhadinha Nova à arte e ao design, cujas experiências para hóspedes incluem workshops de cerâmica, de buinho, de terracota ou de botas alentejanas, numa busca pela proximidade com a herança cultural da região.
Vermelho Melides
Fundado por Christian Louboutin, criador da marca de alta-costura epónima, o mais recente membro da Relais & Châteaux em Portugal apresenta-se como um lugar intimista onde cada detalhe se evidencia de forma maximalista. Totalmente decorado com mobília, antiguidades e objetos da coleção privada do proprietário, o hotel boutique situado no cenário tranquilo de Melides reúne 13 quartos e suítes repletos de peças de vários cantos do mundo, combinações ousadas que vão ganhando protagonismo no projeto imaginado pela arquiteta Madalena Caiado.
Da fachada esculpida à mão pelo escultor italiano Giuseppe Ducrot aos azulejos artesanais locais ou frescos do artista grego Konstantin Kakanias, passando ainda pelos candeeiros, esculturas e mobiliário dos criativos Elisabeth Lincot, Nicolas Cesbrón ou Pierre Yovanovitch, são vários os exemplos de celebração da art de vivre de Louboutin neste lugar que nos faz sentir em casa, apesar de cada rasgo de mundividência.
Immerso, Ericeira
Neste hotel de 5 estrelas na Ericeira todos os espaços têm peças de artistas contemporâneos, maioritariamente portugueses. Exemplo disso mesmo são os painéis no lobby e nos quartos assinados por Iva Viana, ou os tapetes artesanais feitos a partir de desperdícios de lã e algodão orgânicos da SUGO CORK RUGS, de Susana Godinho, e os candeeiros e as cadeiras de baloiço da Oficina 166, de Diana Cunha.
Casar os seus trabalhos com outros elementos decorativos revelou-se um desafio prazeroso para a proprietária do hotel, Alexandra Eça d’Almeida (curadora “informal” dos interiores do hotel), que escolheu também peças do designer mexicano de mobiliário Diego Franco, tapeçarias LRNCE, de Laurence Leenaert, um espelho da autoria de Anna Westerlund, e uma mandala Palmas Douradas, de Maria João Gomes. No exterior, o pintor e escultor João Noutel assina a instalação escultórica “Mergulho em Ti”; Paulo Reis é o autor de “Uniouriço”, a intervenção artística à entrada da propriedade que não passa despercebida; o “banco-anel” com vista para o mar foi criado pelo Los Pepes Studio; e a estátua do guardião da Ericeira, no bar, é uma criação de José Queiroz.
Martinhal Lisbon Oriente
A estreita relação de Chitra e Roman Stern com o panorama artístico português remonta a 2011, ano da criação do Arte, Design e Well-being Weekend, um evento único, que acontece anualmente no Martinhal Sagres, o primeiro resort do grupo em Portugal. Desde então, as relações criadas com artistas portugueses, ou residentes em Portugal, levou a um investimento anual em obras de arte especialmente criadas para o evento e inspiradas no universo Martinhal. Trabalhos de artistas contemporâneos conceituados como Ana Pérez-Quiroga, Inez Teixeira, Jorge Santos, Rui Sanches, Teresa Pavão, Kruella d’Enfer, Tamara Alves, Vasco Águas, Pedro Batista, Maria Imaginário, Graça Paz, Oficina Marques e Henriette Arcelin fazem hoje parte da experiência dos hóspedes, quer no Martinhal Sagres, quer no Martinhal Chiado, e mais recentemente no Martinhal Lisbon Oriente e Martinhal Residences.
Neste último, obras originais de Graça Paz, Pedro Batista, Vasco Águas, Tamara Alves, Kruella d’Enfer e Bordalo II foram criadas exclusivamente para o projeto, estando agora em exposição ao longo de todo o edifício, em vários espaços interiores e exteriores, públicos e privados, para serem usufruídas por visitantes, hóspedes e residentes.
Hotel das Amoreiras, Lisboa
Com morada no bucólico Jardim das Amoreiras, o Hotel das Amoreiras é um “pequeno grande hotel”, como os próprios donos aludem, que evoca o conforto e o luxo despretensioso de uma casa de campo na cidade. Contudo, prima também por um toque internacional oriundo de referências que o casal Pedro Oliveira e Alicia Valero foi colecionando ao longo dos anos, como peças de mobiliário, de decoração e também de arte.
A seleção de quadros, fotografias e demais peças artísticas é um dos pontos-chave que completa este projeto: escolhidas a dedo por Pedro, algumas das quais da sua coleção pessoal, é nas diferentes áreas comuns do hotel que pode encontrar desde quadros e serigrafias de autores como os suíços Maurice Barraud e Alberto Giacometti ou o espanhol Manolo Valdés, a um poster original de um filme de James Bond no ponto central do bar. Mas o mais importante seja talvez mesmo um quadro pintado pelo seu pai, que o acompanha há vários anos, de casa em casa, de país em país, e que agora faz parte do hall de entrada — o cartão-de-visita para quem entra no Hotel das Amoreiras.
Torel Palace Lisbon
Depois de celebrar o seu décimo aniversário em 2023, o Torel Palace Lisbon renasceu com uma alma totalmente nova, mantendo a excelência no serviço e em todos os detalhes. Além da adição de um novo palacete de 10 quartos e suites – a Casa do Lavra -, o hotel conta agora com uma nova piscina, uma torre com vistas impressionantes para o centro da cidade, um SPA e hamame e o Duke’s Bar, um novo bar clássico de inspiração inglesa.
Neste último, são várias as obras de arte do espólio da Galeria Filomena Soares que preenchem os seus interiores, uma colaboração entre o grupo Torel Boutiques e a galeria lisboeta que arrancou em abril deste ano, e que acompanha o trabalho desenvolvido pela designer de interiores Isabel Sá Nogueira, elevando a um novo patamar a experiência de todos os hóspedes e clientes. Edgar Martins, Gonçalo Sena, Sofia Yala, Slater Bradley, Letícia Ramos, Herbert Brandl, Rodrigo Oliveira, Francisco Leiro, João Penalva e Carlos Motta são alguns dos nomes que assinam as obras de arte presentes nos quartos, corredores, bar, biblioteca e no restaurante Black Pavilion.
Gran Cruz House, Porto
Neste boutique hotel, localizado no coração da Ribeira do Porto, cada quarto é um quarto, e não existem dois iguais. A cada um foi dada uma nomenclatura das diferentes famílias do Vinho do Porto (Pink, White, Ruby, Tawny, Reserve, LBV e Vintage), mas o mote de inspiração para a decoração foi a paleta cromática da campanha Porto Cruz sob o slogan “País Onde Negro é Cor”.
A figura central é a Mulher de Negro, um ícone da marca que existe há quase quatro décadas e que tem funcionado como um elogio simultâneo ao lado mais colorido e misterioso da alma portuguesa. O resultado são sete quartos irrepetíveis, que contaram também com a colaboração de sete artistas plásticos contemporâneos, que foram desafiados a reinterpretar a Mulher de Negro. Em cada quarto surge uma porta intervencionada individualmente por um dos seguintes artistas convidados: Ângela Ferreira (Kruella D’Enfer), Albuquerque Mendes, João Jales, Jorge Curval, José Emídio, Rui Anahory e Tamara Alves.
Casa de São Lourenço, Manteigas
A Casa de São Lourenço leva-nos numa descoberta pelo design português através dos seus elementos decorativos. A presença de design contemporâneo no projeto de interiores é muito forte, mas acima de tudo faz-se um grande elogio ao design nacional, mantendo o belíssimo mobiliário de Maria Keil, uma das mais relevantes artistas portuguesas do século XX, recuperado no seu interior.
A par dela, há vários designers portugueses: Nuno Gusmão, Marco Sousa Santos, Vícara, Útil, Grestel, Bordallo Pinheiro, Bartolomeu Gusmão, Vanda Guerreiro e Burel Factory, com várias peças de autoria vernacular criadas por artesãos da região, como as olarias de Molelos ou os cestos de Gonçalo, peças únicas e representativas de Portugal, escolhidas para dar sentido a cada espaço e a cada canto da Casa de São Lourenço. O burel tem uma grande presença no espaço, ajudando a contar a história enquanto adensa o mistério da descoberta dos pormenores: as paredes revestidas com bordados de poesia de Fernando Pessoa, os painéis pintados à mão e as instalações de arte que trazem um caráter intimista, ao mesmo tempo que nos embalam na história tecida pela montanha.
Ventozelo Hotel & Quinta, Douro
Ventozelo não é apenas um hotel, é o Douro numa quinta. Com uma área de 400 hectares, 200 dos quais de vinha, é uma das maiores e mais antigas do Douro, já com mais de 500 anos de história, e uma matriz desde sempre assente tanto na arte de bem receber, como na arte de refletir sobre o território onde se insere. Foi com isto em mente que, em 2021, pela mão da associação Amigos de Ventozelo, a quinta foi palco da inauguração de uma exposição do pintor Sobral Centeno, que teve como mote o Douro e as suas belezas naturais.
Com curadoria de Manuel Novaes Cabral e de Nuno Faria, seguiram-se mais quatro, todas elas inspiradas no Douro, que contemplaram um artista plástico consagrado, que apadrinhou sempre de seguida o convite a um artista mais jovem. Pintura, escultura, fotografia: após dois anos deste inusitado ciclo de exposições, abertas ao público em geral, é hoje possível passear por Ventozelo Hotel & Quinta e encontrar obras de Sobral Centeno, Luísa Mota, Graça Pereira Coutinho, Catarina de Oliveira e Paulo Neves espalhadas pela quinta, desde os jardins nas margens do rio Douro, aos antigos lagares ou às paredes do restaurante.